sábado, 25 de setembro de 2010

PALMARES, E AGORA?

A REALIDADE DE PALMARES

Cheguei a Palmares-PE, dia 8 de setembro de 2010, estou hospedada na casa das Irmãs Servas da Caridade, onde ela tem um abrigo de pessoas idosas.

No dia 9, de manhã fui ao centro da cidade, na prefeitura, na catedral e por ali ver os estragos da enchente. Há cratera em frente à prefeitura, onde na TV passava uma carreta com as rodas para cima, disseram que era uma praça muito organiza, hoje só ruína. A cidade está tomada de poeira, onde tem muito movimento de carro fica pior, em alguns estabelecimentos comerciais ficam molhando a rua na frente para amenizar a poeira. Já está completando três meses deste desastre e a gente percebe a omissão do poder público, tem muito entulho nas ruas das reformas que a população está fazendo. As bocas de esgotos todas abertas em pleno centro da cidade, tem que andar muito atento a onde pisa, senão há risco de cair nos buracos. Mesmo com relação a poeira, muitas pessoas tem passado mal com problemas respiratórios, principalmente crianças e pessoas idosas, isso é questão de saúde pública, está ruas empoeirada já deveriam ter lavado, muitas pessoas andam com mascaras para não ficarem inalando a poeira contaminada.

Dia 10, fui com uma senhora em um povoado, o qual fica 10 km de distância da cidade. Ao longo da BR por onde passamos segue beirando o percurso do Rio Una, o causador da enchente. Vi muita destruição, o rio assoreado, sem mata ciliar e a sede do Engenho muito próximo à beira do Rio. Ao redor é só plantação de cana-de-açúcar, a monocultura da região. Eles foram atingidos pela enchente, saíram de casa somente com as roupas “do couro” como dizem, ficaram no relento vendo a água descer levando tudo que tinha na frente, inclusive viram a ponte ser levada como se fosse um isopor. Para chegarmos ao Engenho União, atravessamos o Rio de barco, a Senhora foi fazer a Celebração da Vida pela Pastoral da Criança. Tinha muitas crianças, mulheres jovens, com dois, três filhos cada. Pesamos 19 crianças de 0 a 6 anos. Crianças lindas e saudáveis, apenas duas que estava abaixo do peso.

Os moradores foram atingidos pela enchente, nas casas percebemos a destruição, principalmente aquelas feitas de enchimentos de barro. A ponte que dá acesso ao povoado foi carregada pelas águas, ficando somente os alicerces destruídos. Assim, a população tem que fazer a atravessia de barco, mesmo as crianças para irem à escola, os produtos que trazem para comercializar na feira da cidade. Mesmo diante do que passaram moradores estão jogando lixo no rio, perceber que falta educação ambiental para cuidarem do rio.

Na viagem quando íamos, algumas mulheres do distrito de Cerro Azul, que foram atingidas pela enchente, iam falando que não tiveram assistência, outras que só receberam coisas velhas, as coisas boas foram desviadas, muitas pessoas se aproveitam da situação para obterem as coisas.

No dia 11, fomos ao Centro Social Urbano, onde estão acampados os desabrigados, foram tirados das escolas e estão todos neste local. Há mais de cem barracas que foram doadas pelo Rotary Internacional. Algumas famílias que tem necessidades especiais (idosos, deficientes, bebês recém nascidos...) ficam no espaço da creche, dividido por lençóis, cobertores...

Passamos em algumas barracas para conversar com as pessoas, escutamos muitas reclamações em relação à alimentação, comida mal feita, às vezes estragada como disse uma senhora “nem cachorro come”. Pessoas doentes com diabetes e outros problemas, têm que comer a mesma comida.

Falaram que o café é servido a partir das 8h30, e as crianças não estão indo a escola, o almoço serve pelas 13 horas, e a janta a partir das 16h30, quando é hora de deitar já estão com fome, nem biscoito recebem para dar as crianças, é muito sofrimento, disse uma senhora.

Algumas famílias estão improvisando cozinha para fazerem sua própria comida, mas o pessoal da coordenação não quer fornecer os alimentos.

Algumas famílias já receberam o auxilio enchente, para outros está para sair dia 30, e outros não conseguiram encaminhar for falta de documentos que perderam na enchente. Aqueles que receberam o auxilio estão comprando alguns alimentos para complemento.

Falaram que não estão recebendo as coisas que vem, está sendo desviada. Mesmo a alimentação, tem dia que só comem arroz com mortadela. Esta semana chegou roupa, e pegaram as melhores e o resto uma psicóloga mandou jogar na quadra para quisessem fosse pegar.

Existem situações diversas, algumas barracas estão bem organizadas, limpas e enfeitadas, outras que só têm os colchões dentro. Disseram que tem pessoas que estão se aproveitando da situação, tem casa, alugaram e estão na barraca para ganhar outra casa, casos assim estão descobrindo e o pessoal da organização está desmontando a barraca. Assim, prejudica quem de fato necessita, pois não podem deixar a barraca sozinha, sempre deve ter alguém cuidando, pois a cada momento o pessoal está fazendo a averiguação.

Na entrada havia um monte de lixo, e no lado das barracas outro, com cheiro mau, disseram quando o sol esquenta mais, ninguém suporta. A coleta, falaram que é feita a cada três dias, mas o pessoal da organização falou que são coletados todos os dias. Em plena manhã as 8 horas, os montes de lixo são enormes .

Ontem, dia 15, com a irmã Custódia que veio ficar comigo uns dias, fomos ver os acampados. No dia anterior choveu bastante, as pessoas estavam colocando os colchões no sol, tapetes e demais coisas. Haviam recebido lonas pretas para forrar as barracas, estavam todos em movimento: limpeza, lavando roupas para aproveitar o sol, arrumando, outros saindo para a rua. Quanto à alimentação, disseram que melhorou um pouco mais, está saindo mais cedo, estão conseguindo tomar café e levar as crianças para a escola. Haviam duas mulheres fazendo o cadastramento das crianças para o PETI. O monte de lixo que havia no lado das barracas foi tirado, só o da frente que continua e com mau cheiro.

Percebe-se que está diminuindo o número de barracas, algumas pessoas que estão recebendo o auxilio enchente, estão alugando lugares para ficarem, outros estão voltando para suas casas mesmo nas áreas de risco. Segundo informação de uma pessoa, disse que as casas vão ser construídas através do programa Minha Casa Minha Vida, irão ficar pagando mensalmente 50, 00. Disse ainda, que o coordenador falou que quando receberem o auxilio enchente é para eles irem deixando as barracas, mas ela disse que sai de lá só quando receber a casa, que o dinheiro do auxilio vai deixar para comprar as coisas que perderam na enchente.

Tem muitas pessoas envolvidas trabalhando, ou ao menos vestindo a camisa; vimos andando no meio das barracas, um grupo de crianças estava tendo aulas de capoeira; na entrada do posto de saúde, havia umas caixas de roupas e um grupo de pessoas escolhendo para si; à tarde fomos andar pela cidade na beira do rio, vimos muita destruição; em muitas casas as pessoas estão reconstruindo, outraa já tem famílias morando, algumas casas só sobraram às escadas, outras o alicerce, outras pela metade. Conversando com algumas pessoas, elas chegavam a chorar, pois disseram que viram a morte pertinho, saíram com a água batendo nos peitos.

Estes dias passei mais vendo e ouvindo algumas pessoas, perceber o chão que estamos pisando. Vimos que as demandas dos desabrigados são diferentes, há demanda especifica da zona rural e da população urbana. Há demandas a curto, a médio e a longo prazo. Isso significa dizer que a luta será muito grande e com muitos desafios. Requer a estruturação de um organismo forte que funcione como canal de diálogo entre os atingidos e o poder público, a partir das organizações populares. Desta forma nossa presença é acompanhar a articulação das organizações populares na reivindicação de seus direitos.

Palmares, 15 de setembro de 2010

Irmã Marisa Ribeiro do Amaral

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Uma irmandade chamada Provincia São Francisco de Assis. Um grupo de 105 mulheres de várias etnias e regiões desse país chamado Brasil. Estão presentes em vários países desse globo. Tem como opção de vida seguir Jesus Cristo ....

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